sábado, 28 de março de 2015

MOVIMENTO ASSOCIATIVO POPULAR

«Conclusões do Encontro Nacional de Quadros do PCP sobre 
MOVIMENTO ASSOCIATIVO POPULAR

ÍNDICE
1. O PCP e o Movimento Associativo Popular
2. Por um país mais associativo
3. Uma situação de dificuldades, mas em desenvolvimento, diversificação e crescimento.
3.1. Uma poderosa economia social, gerada e gerida pelas Associações
3.2. As associações não são empresas
3.3. Uma nova política fiscal para as Associações não lucrativas
3.4. Voluntariado, um valor insubstituível do Movimento Associativo popular
3.5. Aprofundar a relação das associações com os seus associados
3.6. O Movimento Associativo e novas urbanizações e as novas populações
3.7. O papel do Movimento Associativo popular face à juventude
3.8. Formação, tarefa central para elevar a capacidade dirigente e técnica
3.9. Renovação e inovação na esteira das melhores tradições associativas
3.10. A cooperação, a coordenação, e a organização e a estrutura do Movimento Associativo
3.11. Potenciar o gosto pelo convívio e pela vida colectiva
3.12. Uma legislação insuficiente e desajustada da realidade
4. O Movimento Associativo face aos Poderes constituídos
4.1. Poder Central
4.2. Poder Local
4.3. O movimento associativo e a regionalização
5. O PS, o Governo socialista e a sua política para o movimento associativo
6. O Movimento Associativo Popular e a União Europeia
7. Propostas do PCP para o desenvolvimento e fortalecimento do Movimento Associativo popular

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O PCP e o Movimento Associativo Popular
O Partido tem valorizado e reconhecido o papel do Movimento Associativo Popular na sociedade portuguesa.

Não é demais relembrar que já no tempo da ditadura fascista, apesar das limitações, pressões, discriminações, tentativas de instrumentalização e mesmo perseguição, o associativismo se afirmou, pela sua natureza e pelas suas profundas raízes populares, como um factor de consciência cívica, de cultura e de vida democrática dos cidadãos.

A importância e o valor do associativismo popular decorre do facto de constituir uma criação e realização viva e independente do povo português; uma expressão da acção social das populações nas áreas da cultura, do desporto, do recreio, da educação, do património, etc.; uma expressão da consciência cívica, da criatividade e do talento das massas populares, assumindo-se como elemento valioso da qualidade de vida dos portugueses.

Por outro lado, pela sua própria natureza o associativismo popular é expressão e exercício de liberdade e exemplo de vida democrática. É uma escola de vida colectiva, de cooperação, de solidariedade, de generosidade, de independência de humanismo e cidadania. Concilia valor colectivo e individual. Pelo que, defender, reforçar, apoiar e promover o desenvolvimento do movimento associativo é defender e reforçar a democracia e a participação dos cidadãos na vida social, na perspectiva de luta por uma democracia política, económica, social e cultural.

O Movimento Associativo Popular constitui um dos corpos intermédios da sociedade, com carácter profundamente consciencializador, um movimento imparável face às necessidades profundas das populações (necessidades de que é profundamente conhecedor e gerador de múltiplos recursos e potencialidades endógenas para lhes fazer face), espaço plural, de resistência cultural e de afirmação de identidade nacional, face ao processo de descaracterização cultural no quadro da integração europeia. É por isso alvo dos ataques de todos aqueles que à escala nacional e internacional defendem o pensamento único e que concebem o exercício da democracia única e exclusivamente como o acto periódico de votar.

O Movimento Associativo é um produto social. Transforma-se com a evolução social, acompanha e participa activamente nessa transformação. Realiza-se tanto mais profundamente quanto mais tenha claros os objectivos da sua intervenção, o seu projecto próprio e o projecto de sociedade para que está orientado o conteúdo fundamental da sua acção.

Com situações diferenciadas e altos e baixos na atenção do Partido ao trabalho dos militantes comunistas nesta área, o traço dominante da acção dos comunistas é o esforço no sentido de contribuir para elevar o nível e a capacidade de intervenção do movimento associativo, na consciencialização e resposta aos problemas das populações e na construção de uma sociedade mais participativa e maior bem estar social.

São disso exemplo:

a criação, e a manutenção em funcionamento regular, do Grupo de Estudos para os problemas do Movimento Associativo Popular junto do CC, associado ao esforço desenvolvido por diferentes Organizações Regionais, no sentido de definirem responsáveis por esta área e criarem grupos de trabalho para a análise da situação e melhoria da acção dos comunistas dirigentes e activistas associativos.
o elevado número de realizações designadamente debates públicos, encontros e seminários sobre o associativismo realizados por iniciativa do Partido ou de instituições unitárias, com convites a representantes do partido, abordando problemas específicos das associações a nível local, concelhio e nacional.
o debate e o acordo generalizado dos homens e mulheres do Movimento Associativo em torno do Projecto de Lei Quadro do PCP sobre o apoio ao Movimento Associativo.
a realização do Encontro Nacional de Quadros do Partido sob o lema «Mais Associativismo, Mais Democracia».
o facto do nosso XIV Congresso ter apontado, de uma forma simples e rigorosa, quatro importantes objectivos para esta área, a saber:
«melhorar o nível de acompanhamento por parte das organizações partidárias, dos problemas do Movimento Associativo e adoptar medidas orgânicas para a ajuda e coordenação da actividade dos membros do Partido que actuam nesta frente»;
«aprofundar e desenvolver os exemplos positivos de colaboração e apoios mutuamente vantajosos entre autarquias locais e o movimento associativo»;

«encontrar formas de cooperação e coordenação associativa e as acções de intercâmbio a nível nacional e internacional»;

«clarificação do papel do movimento associativo para com a juventude, sua relação com o movimento associativo juvenil de forma a assegurar uma ampla participação dos jovens nas associações populares, garantindo o seu próprio rejuvenescimento e contribuindo para a integração social da juventude».
Julgamos consensual para o desenvolvimento e afirmação do movimento associativo, no futuro, a importância da valiosa participação e envolvimento dos comunistas pela dinâmica e mobilização que imprimem às organizações que integram, e porque o projecto comunista para a sociedade portuguesa comporta valores reconhecidos como fundamentais para o Associativismo Popular. Mas também é inegável que o Partido pode enriquecer-se e aprender muito com esta relação estreita com a vida associativa. A participação dos militantes comunistas no Movimento Associativo pode significar entre outros aspectos: novas oportunidades de ligação às populações e aos seus problemas; acesso a mecanismos de concretização de políticas progressistas nas áreas sociais, da cultura e do desporto; um forte envolvimento nas políticas e no desenvolvimento local; participação activa num importante espaço de debate ideológico e político; um entusiasmente contacto com a «militância associativa» e a desprendida vontade de participar de milhares de portugueses; a possibilidade de contribuir para a prestação de serviços às populações; um contributo fundamental para a integração social, os sentimentos de pertença e a identificação das populações com o seu território; relacionamento com diferentes sectores sociais num espaço que se caracteriza pela ampla unidade do movimento; intervir num espaço de luta e de reclamação por objectivos concretos e imediatos; dar expressão a formas concretas de mobilização da juventude e da mulher.

É destas enormes possibilidades de servir o povo e o país que se trata, quando se aborda a relação do Partido com o Movimento Associativo Popular, surgindo clara a importância e a necessidade de melhorar, nas condições actuais, a acção do Partido nesta área.

O Encontro Nacional de Quadros de Partido que se realizou no dia 26 de Maio, é parte integrante da acção do Partido nesta área, e visou dar um contributo para a análise da situação actual do movimento associativo popular, propor linhas de intervenção dos comunistas para a sua dinamização e fortalecimento; contribuir para aprofundar a relação do Partido com a realidade associativa e melhorar a nossa intervenção nesta área e ainda, contribuir para o trabalho preparatório do XV Congresso do PCP, procurando fazer um ponto da situação da acção dos comunistas e ajudar a encontrar respostas e orientações que permitissem ao Partido dar um avanço qualitativo no seu trabalho nesta área.

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Por um país mais associativo

Não existem dados estatísticos precisos sobre o associativismo português, por completa incúria governamental neste terreno.

Diferentes estimativas apontam para a existência de 12 000 a 14 000 associações o que, a confirmar-se, representaria qualquer coisa como mais de 200 000 dirigentes eleitos e mais do dobro deste número se contarmos com os cidadãos que exercem responsabilidades em secções e dinamização de actividades. Por outro lado os estudos feitos ao nível da Região Centro, de alguns distritos e concelhos apontam para uma população associada entre os 25% e os 30% dos portugueses, movimentando a actividade associativa muitos milhões de contos numa importantíssima actividade económica de carácter social.

Estes elementos, apesar das necessárias reservas pelo facto de corresponderem a estimativas (ainda que com base em dados objectivos a partir dos quais é feita a projecção), dão uma ideia do peso e da importância do Movimento Associativo na sociedade portuguesa.

Portugal é, portanto, um país com uma importante e rica tradição associativa, com um elevado número de associações, orientadas para múltiplas actividades que se constituíram, cresceram, desenvolveram e afirmaram em condições específicas do nosso país, assumindo traços e características também específicas e originais. No entanto, seria errado considerar que a existência de uma ampla e diversificada vida associativa seria uma característica exclusiva do nosso país. Se compararmos o número de associações e de associados, face à população, estamos aquém de muitos outros países. (Por exemplo França com 55 milhões de habitantes conta com mais de 700 000 associações.

Esta situação pode ter duas razões essenciais: por um lado o facto de termos vivido durante 48 anos sob uma ditadura fascista em que não existia liberdade de associação tendo-se perdido todo esse tempo (aliás como aconteceu também à vizinha Espanha), enquanto outros países, em democracia, no pós-guerra, avançaram com políticas activas de desenvolvimento associativo. Por outro lado após o 25 de Abril aconteceu uma explosão associativa com a criação de milhares de associações, comissões, pró-associações, grupos informais, etc., que se desenvolveram no auge do período revolucionário e com a liberdade conquistada. Mas logo após o ano de 76, isto é, durante 20 anos, o que tivemos no país nas áreas da cultura, do desporto, do recreio, da acção social, foi uma política inqualificável conduzida pelos diferentes governos com participação do PS, PSD e CDS e, particularmente mais de uma década de cavaquismo, profundamente retrógrada, que destruiu muito do que havia sido feito ao nível da Administração Central, não apoiou o desenvolvimento associativo e hostilizou o movimento associativo popular encarando-o como que um perigoso agente subversivo das massas (ao contrário do que aconteceu na vizinha Espanha onde se deram passos importantes nesta área).

Analisar a situação associativa é elaborar um implacável libelo acusatório para com as políticas prosseguidas pela direita (e também pelo PS) nos últimos 20 anos.

Impõe-se o combate pela criação de condições para que o nosso país se torne um país mais associativo, quer através da mais ampla participação dos associados nas associações existentes, quer no apoio à criação e desenvolvimento de novas expressões associativas, correspondentes às novas necessidades e vontade das populações.

É indispensável ter presente que a actividade e o papel fundamental do Movimento Associativo ao serviço das populações, não é substituível por qualquer outra alternativa de organização social e ainda menos por qualquer solução de ordem comercial.

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Uma situação de dificuldades,
mas em desenvolvimento, diversificação e crescimento

Nos últimos 20 anos, num quadro de grandes dificuldades, triplicou o número de associações existentes no nosso país, com um crescimento exponencial até 1977 e um crescimento continuado mas a menor ritmo até aos dias de hoje.

Para este crescimento é possível detectar algumas razões fundamentais:

a conquista das liberdades democráticas com a consagração da liberdade de associação na Constituição e na lei, com total independência estatutária e autonomia de acção face ao Estado. Aliás o crescimento do número de associações no nosso país ao longo do século XX foi sempre maior em momentos de transformação social: implantação da República em 1910; após o final da 2ª Grande Guerra em 1945; e após o 25 de Abril em 1974, sendo que esta última data constitui um marco histórico na evolução do Movimento Associativo na medida em que após o 25 de Abril se verifica um autêntica explosão na criação de novas associações, assim como o aumento e diversificação das actividades.
o agravamento da situação social que (criando problemas de diverso tipo à participação associativa,) impõe, por outro lado, a auto-organização popular para a solução dos problemas que se colocam no dia a dia das populações (ambiente, património, questões sociais, etc.);
o crescimento do associativismo desportivo, em resposta à falência da escola e do sistema de ensino nesta área, através de uma crescente prestação de serviços e desenvolvimento de práticas desportivas, pagas directamente pelas famílias (segundo os dados oficiais as famílias suportam, pagando directamente, 70% dos custos do desporto, para além dos impostos e do jogo no totoloto e totobola) e ainda como resultado de uma nova cultura do corpo que vai ganhando espaço.
o crescimento das IPSS, associações e outras instituições que intervêm na área da acção social, com uma linha de apoio de cerca de 60 milhões de contos do Governo central (dados de 95), valor que é multiplicado pela acção do Trabalho voluntário. São instituições com uma grande capacidade de organização e coordenação dando resposta a problemas essenciais nas áreas da infância, dos idosos, deficientes e outras valências, beneficiando também de uma aposta clara dos governos de direita que, seguindo orientações que são internacionais nos últimos anos, decidiram desresponsabilizar-se dos seus deveres constitucionais na área da acção social, passando a resposta a estas questões para a «sociedade civil», investindo incomensuravelmente menos. Nesta área é visível uma forte aposta e envolvimento da Igreja Católica.
Este desenvolvimento, crescimento e diversificação associativa, faz-se, em geral, apesar da ausência de cooperação e apoio dos poderes, mas a um ritmo extremamente lento, para permitir recuperar o atraso em relação a outros países.

O desenvolvimento, afirmação e reconhecimento do papel social do movimento associativo exige a solução de alguns problemas e tendências que lhe são exteriores, que visam a sua descaracterização, e ainda resolver problemas que lhe são próprios ao nível da sua renovação e adequação às novas realidades, aspirações, interesses e pólos de atracção das populações, assim como resolver os problemas da sua independência e autonomia de acção face aos poderes constituídos, a sua assumpção como parceiro social, o seu combate pelo cumprimento da Constituição e a sua exigência de que outros também a cumpram designadamente o Governo e a Administração Pública, no seu todo.

3.1. Uma poderosa economia social, gerada e gerida pelas Associações

No nosso país não está quantificado o produto do Trabalho dos milhares de voluntários que intervêm no movimento associativo nem a sua capacidade de captação de recursos, nem o valor do carácter reprodutor do Trabalho voluntário sobre cada unidade de dinheiro investida em actividades associativas, embora estimativas (outra vez as estimativas) apontem para um factor de multiplicação igual a cinco vezes.

Há associações cujo orçamento é maior do que o da sua freguesia e grupos de associações cujo orçamento é superior ao do Município respectivo. Trata-se de uma fortíssima actividade económica cujo produto é reinvestido socialmente em actividades e serviços prestados aos associados, na melhoria das condições dessa prestação, no enriquecimento do património associativo, ou ainda no funcionamento geral das associações. A dimensão e o crescimento desta actividade económica, em geral benéfica para as associações, em muitos casos assume dimensões que acabam por gerar as mais diversas confusões no que respeita à gestão das instituições.

A independência económica é uma condição essencial para a independência e autonomia de acção das associações. As associações em geral vivem dos recursos que conseguem (estudos localizados apontam para 80% de receitas próprias) mas têm o direito de exigir aos poderes constituídos a devolução do dinheiro dos contribuintes para a sua actividade em prol das populações, enquanto parceiros autónomos num quadro de relacionamento e cooperação com os poderes.

De qualquer modo a actividade económica do Movimento Associativo aos níveis e com a dimensão que têm hoje, é um dado novo ainda não completamente integrado quer ao nível social, quer ao nível legislativo. Desde logo, como é uma actividade económica nova não há um regime legal compatível com a natureza e fins das associações, tendo sido encontrado regimes adaptados através da aplicação, com excepções, dos regimes legais em vigor para as empresas (em sede de IVA, IRS, IRC, etc., ainda que de forma mitigada).

É exigível que seja adoptada nova legislação de enquadramento das actividades económicas de carácter social, e não lucrativas, das instituições associativas, das instituições de utilidade pública, adaptada à sua natureza e fins.

3.2. As associações não são empresas

É comum ouvir-se falar, e hoje cada vez mais, que algumas associações são autênticas empresas e que face ao volume de «negócios» algumas associações (para certas pessoas, todas as associações) careceriam de uma gestão empresarial. Em geral se quer significar é que as associações necessitariam de uma gestão mais eficaz, logo «empresarial», consideração esta que nos parece por demais apressada. Esta questão gera a mais profunda das confusões na cabeça de muitos associativistas, dirigentes ou não, e da opinião pública em geral. Uma Associação sem fins lucrativos não é uma empresa, nem é «transformável» em empresa por diversas razões:

quanto aos fins, a empresa tem por objectivo produzir e ou vender um produto, fazer lucro e distribuí-lo; a associação tem como fim prestar um serviço, resolver problemas sociais, desenvolver potencialidades, valorizar os seus associados, reinvestir socialmente eventuais receitas e proveitos realizados em prol de todos os associados e da população;
quanto à relação com os seus membros (o direito administrativo português designa de associado o membro da associação e de sócio o membro componente da empresa/sociedade); no caso da empresa o que conta em termos de representatividade é a força económica e o investimento do sócio, na associação cada associado tem um voto independentemente da sua actividade e do seu contributo económico;
a empresa é constituída e permanece enquanto desenvolve uma actividade economicamente rentável para os seus sócios, a associação é uma emanação da vontade popular que traz benefícios sociais aos seus associados, gere contribuições económicas dos associados que não esperam retribuição económica, e vive e renasce permanentemente pela vontade de sucessivas gerações de associados anónimos, cuja força motora é a resposta a problemas locais, à melhoria da qualidade de vida, a participação popular, o exercício profundo da democracia, etc.;
as empresas não têm acesso ao estatuto de utilidade pública que assegura (ainda que de forma mitigada) um conjunto de benefícios fiscais às associações (isenções, apoios, acesso ao mecenato, bingos, etc.);
as associações podem participar em empresas, enquanto sócios colectivos, as empresas quando muito podem apoiar a actividade das associações.
Podiam alinhar-se outros exemplos mas o que interessa realçar é que pela sua natureza e fins, associações e empresas são entidades diferentes e, em certos aspectos são como o azeite e a água. Sempre que se pensa em transformar uma associação sem fins lucrativos numa empresa, o que se está a dizer é que uma associação vai morrer e vai nascer outra coisa distinta. Não há transformação possível. Toda a discussão em torno dos Clubes de Futebol tem que ver com esta realidade. Uma coisa é o clube participar em empresas com certos fins (gestão de património, gestão de actividades desportivas profissionais ou outras áreas), outra coisa é a ideia de transformação do clube desportivo em empresa. Aí deixaria de haver o clube associação com a relação que hoje tem com os seus associados e passaria a haver uma coisa nova, «clube empresa» com uma nova relação com os seus sócios.

Não há nenhuma razão, seja ela de funcionamento, de gestão ou outras que justifiquem este tipo de orientação a não ser um certo terreno da luta ideológica e uma certa cultura de empresarial que alguns gostariam que conquistasse todos os aspectos da vida social e à qual o Movimento Associativo tem de desenvolver um forte combate para preservar a sua natureza, fins e identidade próprias.

3.3. Uma nova política fiscal para as Associações não lucrativas

No imediato, e enquanto não é definido um quadro legal específico para a actividade económica das associações não lucrativas, é urgente corrigir a inaceitável carga fiscal a que estão sujeitas as actividades do associativismo popular, na realização dos seus fins em prol dos seus associados, da população e do desenvolvimento comunitário em geral. Trata-se de desagravar toda uma actividade económica não lucrativa em que todos os proveitos são reinvestidos socialmente nas actividades e no património colectivo das associações.

Entre outros benefícios e isenções fiscais, torna-se indispensável assegurar ao Movimento Associativo Popular:

Reembolso do IVA, no que respeita aos montantes que incidam sobre aquisições de bens duradouros destinados ao seu funcionamento administrativo; instrumentos musicais destinados a actividades próprias; aparelhagens sonoras e demais equipamentos para salas de espectáculo e auditórios destinados a actividades próprias; livros destinados a bibliotecas próprias; material desportivo e recreativo; investimentos em infraestruturas próprias; outras aquisições comprovadamente destinadas às actividades próprias das associações e que não tenham fins lucrativos;
Isenção do pagamento de quaisquer emolumentos ou taxas pela inscrição no ficheiro central de pessoas colectivas e requisição do respectivo cartão de identificação; publicação gratuita no Diário da República dos estatutos e alterações estatutárias; isenção da contribuição autárquica, do imposto de selo, do imposto sobre sucessões e doações e de sisa pela aquisição dos imóveis destinados à realização dos seus fins;
Isenção de IRC respeitantes às receitas de publicidade em recintos fechados, em actividades sem entradas pagas;
Acesso ao mecenato associativo em sede de IRS e IRC, no que respeita às contribuições e apoios de pessoas singulares e colectivas, respectivamente;
Porte pago para as suas publicações;
Ajustamento do direito de autor à realidade e fins das actividades associativas;
Outros benefícios e isenções no que respeita a encargos com o licenciamento e policiamento das suas actividades públicas; custas e preparos judiciais; custos dos consumos de água, energia eléctrica, telecomunicações, combustíveis (designadamente para aquecimento das piscinas).
Uma nova política fiscal para as associações não lucrativas é uma questão de justiça face ao serviço público que prestam, uma questão de sobrevivência económica para muitas associações e ainda um importante ponto de partida para iniciar a clara separação de águas entre o enquadramento fiscal das entidades com fins lucrativos e as entidades sem fins lucrativos.

3.4. Voluntariado, um valor insubstituível do Movimento Associativo popular

Face à crescente complexidade da gestão de algumas colectividades de maior dimensão, há quem aponte para a necessidade de profissionalização dos dirigentes associativos, dos serviços das associações. Chegou mesmo a haver quem pensasse em profissionalizar os bombeiros, mas, quem assim pensou, feitas as contas aos custos dessa profissionalização, acabou por recuar, face à consciência de que o fim do voluntariado dos Bombeiros corresponderia à total incapacidade de resposta neste sector vital.

Esta solução não só seria perniciosa para a natureza e fins do Movimento Associativo, como seria economicamente impraticável e levaria ao desaparecimento da esmagadora maioria das associações populares.

É natural, no entanto, que em associações que prestam serviços e desenvolvem actividades que movimentam profissionais e grandes somas de dinheiro, que esses serviços se apoiem num trabalho profissionalizado e dificilmente poderia ser de outro modo, mesmo com uma grande participação voluntária dos associados. Situação diferente é a do dirigente voluntário. Embora algumas grandes associações, por necessidade objectiva da sua gestão quotidiana optem ou por contratar alguém que funciona como gestor ou secretário geral administrativo ou ainda admitam a hipótese de profissionalizar um ou outro dirigente.

Esta realidade é a excepção à regra. No que respeita à gestão das associações e à criação de condições para que os dirigentes voluntários possam exercer a sua função social, a reivindicação fundamental ao longo dos tempos e que mantém total actualidade é a da exigência da adopção de um Estatuto Social do Dirigente Associativo Voluntário que crie condições que facilitem o exercício da sua actividade na gestão voluntária das Associações.

3.5. Aprofundar a relação das associações com os seus associados

Muitas das actividades das associações existentes e das novas associações nas áreas da cultura e recreio, mas designadamente das desportivas, centram-se na prestação de serviços. Por razões de sobrevivência económica e pela procura dos associados. Muitas pessoas associam-se porque essa é uma exigência para o usufruto das actividades quer para os próprios, quer para os seus familiares.

Persistem, no entanto, dificuldades de participação, e é possível encontrar uma pequena colectividade com mais associados a pareticipar na sua actividade corrente do que naquela grande colectividade cuja relação com os associados se limita à eleição dos corpos gerentes.

No quadro de uma notável diversificação de actividades e de situações, a participação voluntária dos associados em toda a vida das associações é um factor decisivo para que o movimento associativo possa cumprir integralmente a sua vocação face às populações e ao meio. Esta mobilização é um desafio que se coloca a todos os Corpos gerentes, que, para cada situação concreta, têm que encontrar as formas de relacionamento, as iniciativas, as formas de informação e comunicação, que motivem e estimulem a ampla participação de todos os associados, assegurando a qualidade das áreas de actividade e respondendo à crescente diversificação das características e da intervenção do Movimento Associativo.

3.6. O Movimento Associativo e novas urbanizações e as novas populações

Nos grandes centros urbanos e respectivas periferias, as novas urbanizações crescem a um ritmo acelerado levando à deslocação de milhares de pessoas para enormes dormitórios onde é possível viver-se anos a fio sem conhecer o vizinho do lado, sem condições de vida social nem de convívio a nível local. Esta situação não quer dizer que as cidadãos não se queiram associar ou tenham perdido o gosto pelo convívio. Muitas destas pessoas, aos fins de semana acabam por ir frequentar as colectividades das suas antigas zonas habitacionais, com os seus familiares. O problema central é o da humanização da vida nessas novas urbanizações. Torna-se indispensável, por um lado, assegurar que nos projectos e programas dessas urbanizações seja considerada a reserva de espaço para estruturas sociais, de cultura, de desporto, de convívio. Por outro lado seria possível, com a acção concertada das autarquias (Municípios e Freguesias) e do Movimento Associativo existente, encontrar soluções de organização desta população no sentido da animação de um tecido associativo integrado, que ajude a fixar a população em actividades de cultura, desporto e outras junto da sua área de residência. São experiências positivas nesta área a actividade das Comissões, associações e outras organizações de moradores, de condóminos, etc. que, em geral, evoluíram para uma importante actividade cultural, recreativa e desportiva.

3.7. O papel do Movimento Associativo popular face à juventude

Na abordagem da relação do Movimento Associativo com a juventude, é necessário ter sempre presente que, com o alargamento da escolaridade obrigatória e o acesso mais fácil à informação a todos os níveis, e a novas fontes de conhecimento, os jovens de hoje são, em geral, mais informados, mais conhecedores, mais cultos, mais exigentes e revelam interesses mais diversificados do que outras gerações anteriores. Por outro lado, os jovens de hoje são um produto da vida em democracia, são portadores de uma cultura democrática e de uma exigência e vontade de participação activa e concreta que tem de ser valorizada.

A questão essencial a que tem de ser dada atenção pelo conjunto dos dirigentes e activistas associativos é o combate ao paternalismo e infantilização dos jovens, procurando promover a sua aproximação à vida associativa, à experiência de debate, de decisão, de execução e direcção das actividades e a sua integração na vida colectiva das associações, a todos os níveis. Trazendo o seu dinamismo, reconhecendo-se e valorizando-se a sua experiência própria, assegurando a renovação natural dos dirigentes e o futuro das associações.

Trata-se de varrer da vida associativa pretensas incompatibilidades e artificiais conflitos entre gerações com diferentes experiências. Trata-se de assegurar o notável benefício para as associações que representa a integração (designadamente ao nível dirigente) de diferentes experiências, culturas e expectativas face à vida.

Trata-se de assegurar como funções fundamentais do Movimento Associativo face a este importante sector da população, valorizando-se de entre outras:

contribuir para a integração social da juventude, para a elevação da sua consciência democrática, para a criação de condições de acesso dos jovens à cultura, ao desporto, à ocupação activa do tempo livre e ao lazer, contribuindo assim também para os afastar de caminhos de degradação social, como o consumo de drogas, prostituição, delinquência e violência, situações que afligem crescentemente as famílias portuguesas;
contribuir para a necessária cooperação com o movimento associativo juvenil que intervém na mesma zona;
contribuir e procurar encontrar soluções de integração organizada de grupos de jovens no seio das associações ou outras soluções tendentes a criar espaços próprios de intervenção para os jovens, desde que estes manifestem interesse em formas orgânicas próprias;
procurar integrar os jovens em todas as actividades não só como consumidores mas também e essencialmente como participantes activos estimulando a sua participação social e a sua integração (rapazes e raparigas) em grupos de trabalho, secções, elencos directivos das associações;
contribuir para o conhecimento da situação da juventude da sua área de intervenção e, em cooperação com outras entidades, procurar ajudar a resolver os problemas e dar resposta às necessidades essenciais dos jovens.

3.8. Formação, tarefa central para elevar a capacidade dirigente e técnica

Hoje gerir uma associação é uma tarefa mais complexa do que há 20 anos. São novos os interesses e a exigência de conhecimentos de novas áreas de actividade. Mas também a gestão associativa nas áreas da contabilidade e da fiscalidade se complicaram. O nível cultural e de exigência das populações elevou-se. Torna-se necessário um aprofundamento dos conhecimentos de gestão e administração, assim como conhecimentos técnicos, que facilitem a capacidade dos dirigentes se adaptarem à diversidade das solicitações e das respostas necessárias.

A formação é da responsabilidade do próprio movimento associativo que terá de definir a linha de formação, as áreas a cobrir, os perfis, os conteúdos que lhe interessam e depois partir à conquista de meios para concretizar os seus planos de formação, tenham eles expressão local ou nacional. Essa responsabilidade é fundamental porque permite ao Movimento Associativo preparar a resposta às exigências da sua actividade e às mudanças que necessita promover.

Neste momento são as autarquias que, na ausência de um plano nacional de formação associativa, em cooperação com as associações têm vindo a suprir esta lacuna. É indispensável a adopção de um plano nacional de formação, para dirigentes e para animadores e ou outros agentes e níveis de formação específica nas áreas da cultura, desporto, acção social, etc., procurando atrair meios substanciais da Administração Central, para a sua concretização.

3.9. Renovação e inovação na esteira das melhores tradições associativas

No limiar do novo século, são novos os tempos e os desafios, são novas as necessidades e interesses das populações o que exige o estudo das novas respostas, novas soluções e novas actividades.

Sem perder as suas características essenciais, torna-se premente que o Movimento Associativo, hoje como no passado, assuma um papel relevante na elevação do nível cultural e da consciência das populações na pesquisa de novas actividades e de novas soluções de actuação dos cidadãos para a resposta colectiva à satisfação de interesses e necessidades comuns.

Torna-se indispensável para atingir este objectivo que o próprio movimento, os seus dirigentes tomem consciência e reconheçam a sua força social e que procurem o reconhecimento do valor do associativismo na sociedade.

A experiência tem vindo a demonstrar que são parte integrante desta renovação e factor de inovação:

a formação orientada para a concretização de um projecto social, em que o Movimento Associativo tenha a sua realização plena;
a intervenção da juventude nas associações a todos os níveis, da base à direcção;
a chamada à participação de cada vez mais mulheres, assumindo responsabilidades directivas de diverso tipo e a presidência de um número crescente de associações. A presença dirigente da mulher é um dos elementos mais relevantes do processo de renovação de inúmeras colectividades nos últimos anos, linha de orientação a promover e a estimular, como vital para o desenvolvimento do Movimento Associativo Popular.

3.10. A cooperação, a coordenação, a organização e a estrutura do Movimento Associativo

São inúmeros os problemas comuns às associações populares, independentemente da actividade a que se dedicam, exigindo iniciativas conjugadas para potenciar meios e projectos, e acção de contacto e reivindicação junto do Governo e Administrações Local e Central.

Ao longo dos tempos, com altos e baixos, são frequentes as realizações envolvendo diversas associações de uma mesma zona ou de intercâmbio de associações de diferentes regiões do país; a realização de encontros associativos ao nível das freguesias, concelhos e distritos combatendo-se assim também inúteis e prejudiciais rivalidades que por vezes surgem entre associações.

São frequentes as iniciativas de intercâmbio internacional nas áreas da música, do teatro, etc.

Estão criadas a diferentes níveis (freguesias, concelhos, distritos) coordenações mais ou menos institucionalizadas ou mais ou menos informais, do movimento associativo. Existem diferentes federações associativas, algumas de grande tradição e prestígio e expressão nacional, a maioria delas por área de actividade associativa. Estas estruturas organizam regularmente Encontros, Congressos, etc., para o debate do seus problemas, com destaque para o Congresso Nacional das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto realizado em Outubro de 1993 (organizado pela Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, e pela Federação das Colectividades de Educação, Recreio e Desporto do Distrito do Porto.

Torna-se indispensável contribuir para o fortalecimento da cooperação e, onde possível, para a coordenação do movimento associativo, procurando rentabilizar experiências, potenciar os meios disponíveis e encontrando as formas de organização e estruturas que permitam dar mais força organizada à luta pelos seus interesses e objectivos próprios, pelo reconhecimento e fortalecimento do seu papel na sociedade portuguesa e no quadro da CE, pelo seu reconhecimento como parceiro social.

3.11. Potenciar o gosto pelo convívio e pela vida colectiva

Nos finais dos anos oitenta, inícios dos anos noventa, foi detectada em todo o país e nas mais diversas áreas associativas uma reaproximação das populações designadamente jovem, às colectividades, associações e diversos movimentos de opinião com expressão associativa. O resultado é uma crescente participação em actividades desportivas, colectividades que ganharam nova vida, cineclubes que se reanimaram, bandas, grupos de Teatro, Coros, Ranchos com ampla participação juvenil, com jovens a assumir responsabilidades directivas, com um novo ambiente nas associações, com maior participação feminina. Parece ter renascido o gosto pelo convívio. Uma nova procura de produção e afirmação cultural alternativa à dominante, por iniciativa popular. Esta situação tem-se vindo a prolongar nos últimos anos. É uma oportunidade extraordinária que o Movimento Associativo popular, apesar das muitas dificuldades e do carácter por vezes contraditório da situação, tem de saber integrar na sua vida, renovando-se, rejuvenescendo, reforçando-se.

3.12. Uma legislação insuficiente e desajustada da realidade

A legislação em vigor, referente ao Movimento Associativo popular, salvo situações específicas de áreas associativas também específicas (Ex: IPSS...) é manifestamente insuficiente.

o Estatuto de Utilidade Pública carece de actualização e adequação às novas realidades, designadamente à crescente actividade económica das associações e às novas experiências associativas;
a legislação sobre Mecenato não tem que ver com a realidade do associativismo cultural, centrando-se apenas na reabilitação do património nacional;
a portaria do Porte Pago tem de ser revogada e elaborada nova legislação de âmbito mais amplo, que beneficie o conjunto do Movimento Associativo;
é necessária a elaboração e publicação do Estatuto do Dirigente Associativo Voluntário que entre outros direitos e regalias, assegure alguma libertação laboral aos dirigentes associativos;
é indispensável a aplicação de nova legislação que enquadre as Actividades Económicas, não lucrativas, das associações, de acordo com o seu carácter social;
é urgente a adopção de uma Lei Quadro de Apoios ao Movimento Associativo, na linha do Projecto apresentado na AR e que o PCP irá reapresentar nesta legislatura, que clarifique o relacionamento, em termos de apoios, do Movimento Associativo com a Administração Central.
Trata-se de avaliar a situação associativa, analisar a legislação existente e, de forma coordenada e articulada elaborar legislação tendente a facilitar o desenvolvimento do movimento associativo, o seu crescimento, o seu funcionamento, facilite a actividade dos dirigentes e activistas, assim como a regulamentação dos apoios económicos e outros que o Movimento Associativo tem direito, por parte do Estado, designadamente do Governo e Administração Central.

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O Movimento Associativo face aos Poderes constituídos

O Movimento Associativo, pela sua natureza, nasce, desenvolve-se, afirma-se, intervém na vida social pelos seus próprios meios, muitas vezes sem contar com qualquer tipo de cooperação ou apoios de outras instituições. É um movimento que se afirma independentemente dos poderes e, na maioria dos casos, apesar dos poderes e em permanente reclamação, reivindicação e exigência face aos poderes, pelos seus direitos legais e constitucionais.

No entanto, o Movimento Associativo popular relaciona-se de uma forma privilegiada com as autarquias locais (Freguesias e Municípios), com os governadores civis e mais longinquamente com as CCR's e Governo Central. Ao nível da Administração Central as instituições mais solicitadas são a DGOT, o INATEL, o INDESP, e o Instituto de Juventude e, em tempos as estruturas da área governamental da cultura, entretanto desactivadas.

4.1. Poder Central

A Constituição da República Portuguesa nos seus artigos 73º e 79º é clara ao apontar para a colaboração do Estado com as «associações e fundações de fins culturais, as colectividades de cultura e recreio, as associações de defesa do património cultural, as organizações de moradores e outros agentes culturais» e com as «associações e colectividades desportivas», na promoção e na democratização da cultura e do desporto.

Em muita legislação é reconhecida a importância do movimento associativo e o seu papel na sociedade. Por exemplo o Estatuto de Utilidade Pública (Decreto Lei 460/77) em cujo preâmbulo se pode ler «a instauração da democracia criou um ambiente propício ao desenvolvimento do movimento associativo, e recente legislação, a começar pela Constituição, não só garante o livre exercício do direito de associação como simplifica o processo de aquisição, pelas associações, da personalidade jurídica. Determinadas associações, umas com longa existência e outras mais recentes, prestam relevantes serviços à comunidade, suprindo muitas vezes o papel do próprio Estado».

Mas o Estado, e designadamente os governos, não têm vindo a acompanhar na sua política concreta e na sua relação com o associativismo as linhas orientadoras e apreciações acima referidas.

É com preocupação que vemos que onde deveria haver colaboração houve indiferença, substimação e por vezes desprezo e hostilização por parte dos governos de direita para com o movimento associativo.

Ao contrário da necessária colaboração surgiram sucessivas causas de conflitualidade resultantes da acção governamental, seja pelas medidas erradas que toma, seja pelas indispensáveis medidas de apoio ao associativismo que não assume, criando novas e crescentes dificuldades ao desenvolvimento do associativismo e complicando a sua actividade diária.

As CCR's são estruturas distantes que tal como os governadores civis (estes habitualmente activíssimos, de cheque em riste, quando dos períodos eleitorais) têm funcionado ao sabor dos interesses do momento, sem qualquer relação séria com o Movimento Associativo.

É urgente uma nova postura da Administração Central face ao movimento associativo, procurando contribuir para a sua dinamização e desenvolvimento, encontrando-se estruturas e mecanismos que permitam fazer um balanço regular da vida associativa, apontar propostas e elaborar os mecanismos necessários ao desenvolvimento e à facilitação da vida associativa.

4.2. Poder Local

É um lugar comum dizer-se que o Poder Local democrático desempenha um papel fundamental no desenvolvimento da cultura e do desporto, assumindo junto das populações e do movimento associativo, as suas responsabilidades e, na maioria dos casos, também as responsabilidades que caberiam ao poder central. Esta postura nem sempre é devidamente valorizada e, pelo contrário, é muitas vezes utilizada para «justificar» a naturalidade da transferência de responsabilidades do Governo para as autarquias, sem as respectivas contrapartidas financeiras, ou para ser apresentado e capitalizado politicamente como se de actividade da responsabilidade governamental se tratasse.

A relação do Movimento Associativo com o Poder Local democrático assume formas diversas e corresponde a uma necessidade objectiva que torne mais natural e fácil o contacto com os interesses e aspirações das populações.

Sendo indispensável que cada autarquia assuma as suas próprias realizações para as populações nas áreas da cultura, do desporto e do lazer, e dando este facto como assente, parece no entanto que seria importante que esta actividade não retirasse força e expressão à acção associativa e que fosse dada uma grande importância às realizações desenvolvidas com o movimento associativo, assim como ao apoio e à criação de condições para que o movimento associativo desenvolva com crescente autonomia e independência, as suas próprias realizações.

Cabe à autarquia definir o seu projecto e a sua própria política, decidir as linhas de força da sua actuação nas suas diferentes áreas de intervenção. Mas o acerto das orientações políticas poderá ser tanto maior quanto melhor for o estudo das situações e do terreno onde se vai intervir e quanto mais ampla e mais democrática for a auscultação dos diferentes intervenientes, nos processos de desenvolvimento da cultura e do desporto e outras áreas.

Assim, para que o Poder Local assuma as suas responsabilidades face ao Movimento Associativo Popular, parece indispensável:

O envolvimento do movimento associativo popular no debate dos planos de actividade e orçamentos, dos PDM's, do processo de regionalização e de todas as suas implicações. Trata-se de debater com milhares de dirigentes e activistas associativos, que poderão contribuir com a sua opinião crítica, para as linhas e planos de desenvolvimento; para o levantamento mais preciso das necessidades de infraestruturas, equipamentos e meios humanos; para uma mais equilibrada gestão de apoios; para um maior conhecimento dos interesses das populações; para uma relação mais viva e acompanhamento crítico do movimento de massas ao poder que é exercido a nível local e, naturalmente, para a concretização da política e acções para cuja definição contribuíram.
O contributo para a animação, para um maior dinamismo, autonomia e capacidade de realização própria do movimento associativo.
O contributo para que o movimento associativo assuma formas superiores de coordenação e cooperação numa linha de fortalecimento dos mecanismos de participação democrática das populações e de criação de condições e de espaços de criação e de fruição de actividades culturais, desportivas e de lazer.
Na medida das suas possibilidades continuar a dar todo o apoio em infra-estruturas, equipamentos, dinheiro e de múltiplas outras formas na base de protocolos de cooperação, apoiando acções de formação, apoiando a informação, etc.. Assegurar que todo o apoio, designadamente o apoio financeiro, deveria ter em conta critérios debatidos e acordados com o movimento associativo (rompendo com processos menos claros e soluções de saco azul, distribuição de benesses por interesse político, compadrio e amiguismo tantas vezes ainda patentes na acção de certas autarquias e na prática do Governo e da Administração Central). Critérios esses que segundo a experiência deveriam ter em conta as necessidades de manutenção e fomento das associações, os seus planos de actividade, as necessidades de criação ou rentabilização de meios técnicos, materiais e humanos, a participação e as contrapartidas em relação aos planos de desenvolvimento da autarquia, a responsabilização do movimento associativo, a definição de prioridades de actuação escalonadas em cada ano e durante o mandato (ou mandatos), a diversificação de áreas de intervenção, etc.. Sempre numa postura negocial entre parceiros com identidade própria e com a consciência de que a criação de melhores condições para que as associações desenvolvam a sua actividade é um dever do Estado que assim redistribui riqueza, devolvendo à população parte do seu contributo financeiro (em impostos), ao serviço das populações.
Criar espaços de participação e fóruns de debate contribuindo de forma decisiva para a elevação do nível de consciência social dos dirigentes associativos atribuindo as responsabilidades a quem as tem, assumindo as suas próprias responsabilidades face ao desenvolvimento cultural e desportivo, e ao associativismo, na óptica da melhoria da qualidade de vida das populações, mas ajudando também a clarificar as responsabilidades do Governo e da Administração Central, nesta matéria. Responsabilidades de que o Poder Central se tem descartado impunemente passando o odioso das dificuldades criadas pela política de direita, lesiva dos interesses das populações, para o poder mais próximo e mais acessível, o Poder Local.
Ainda no terreno dos apoios é de rejeitar atitudes paternalistas, facilitistas e sem mútua responsabilização. Ao contrário parece fundamental estimular o espírito crítico e criativo do movimento associativo.
Parceiros de um barco comum, o Poder Local e o Movimento Associativo, têm nesse barco (a elevação das condições de vida das populações, a promoção da participação, o aprofundamento da democracia, a resposta a problemas concretos e a participação na execução de políticas correspondentes) tarefas distintas e complementares, sendo que a vigilância crítica do movimento associativo e todas as expressões organizadas das populações e dos cidadãos individualmente considerados, constituem elementos fundamentais para que o poder local mantenha as suas características e aprofunde os seus traços de democracia e de participação popular.

Nem sempre as autarquias assumem com correcção este papel. Em muitos casos o que acontece é o apoio selectivo aos amigos da sua área política, a discriminação de associações de orientação democrática, as tentativas de instrumentalização do movimento associativo, o aproveitamento de posições associativas estritamente para projectar influências partidárias e eleitorais. Nestes casos, ao movimento associativo resta o caminho da luta, da contestação, da cooperação interassociativa para corrigir e impedir este tipo de comportamentos.

O movimento associativo desempenhou ao longo dos anos e desempenha hoje um papel insubstituível na sociedade portuguesa. O papel que as Autarquias podem desempenhar na defesa e aprofundamento das suas características democráticas, associativas e de intervenção social constituem um contributo de relevante importância para a consolidação da democracia no nosso País.

4.3. O movimento associativo e a regionalização

A regionalização, como a entende o PCP, constitui um processo normal e natural de democratização dos processos de decisão, de racionalização dos recursos do país, e dos investimentos, de promoção de qualidade de vida. É um instrumento que favorece a democracia participativa ao possibilitar a aproximação dos serviços públicos às populações e ao estimular a sua participação. Pode assumir-se ainda como um factor capaz de promover o desenvolvimento e dinamizar o investimento público se for acompanhada por uma política nacional no mesmo sentido. Regionalizar é descentralizar e desburocratizar, criando-se uma nova autarquia regional com poderes importantes ao nível do desenvolvimento regional.

As regiões são relevantes para o desenvolvimento do movimento associativo. Todos os associativistas tem sentido quão distante e indiferente tem estado o poder central e como as CCR mais não têm sido que instrumentos dessa distância e indiferença.

Com a regionalização, além do desaparecimento das CCR's, também deixarão de existir os governadores civis, ambos órgãos não eleitos, representativos da Administração Central, face às quais as populações não detêm hoje mecanismos de controlo democrático, e cuja actuação face ao Movimento Associativo, designadamente e de uma forma mais directa, dos governadores civis, foi e ainda é, em geral, discricionária e discriminatória.

O Movimento Associativo Popular terá muito a ganhar com a Regionalização, com a descentralização de poderes e a sua proximidade às populações. O Movimento Associativo, mais do que um beneficiário, pode e deve ser também um construtor activo e um futuro parceiro do poder regional. A construção da Regionalização do País é também uma tarefa que o Movimento Associativo deverá encarar com o empenho, construindo também novas condições para o seu desenvolvimento futuro.

5
O PS, o Governo socialista 
e a sua política para o movimento associativo

A análise da situação associativa, o seu desenvolvimento recente e os problemas que o afectam são indissociáveis da política de direita dos últimos anos, com consequências gravosas para o Movimento Associativo.

Foram tempos de desvalorização do Movimento Associativo, de tentativas de instrumentalização, de atentados à sua dignidade e independência, de incumprimento das funções constitucionais do Estado.

Derrotado o PSD, agora com o Governo socialista não é visível qualquer política de desenvolvimento associativo por parte do PS.

As referências ao Movimento Associativo surgem no programa do Governo no Capítulo referente ao desporto, mesmo assim só e apenas em termos de hipotéticos apoios materiais.

A avaliação da relação do PS e do seu Governo com o Movimento Associativo só pode ser feita (para além da ausência de uma política associativa expressa) através da acção política nas diferentes áreas governativas que interessam ao Movimento Associativo popular e o seu impacto na vida associativa. E aí a situação não é boa.

Ao nível da política cultural, tudo aponta para a continuidade de orientações anteriores que privilegiam as grandes estruturas culturais centrais, deixando de fora a produção cultural popular, inviabilizando qualquer hipótese de promoção de uma política de desenvolvimento cultural do país. Não se vislumbra, neste momento, uma política de descentralização e a nova lei orgânica do Ministério da Cultura, como pedra de toque para a solução dos problemas, no imediato não fornece nada de novo ao Movimento Associativo Popular.

Ao nível do desporto a situação não é diferente, com o Secretário de Estado (a tempo inteiro para o desporto) a não justificar, para já, a sua existência. Centrando toda a sua atenção na alta competição, no desporto profissional e designadamente no futebol, não se vislumbrando uma única ideia ou acção que aponte para uma política de desenvolvimento desportivo que, tendo como centro das suas preocupações a criação de condições para que todos os cidadãos tenham acesso à prática desportiva, teria de contar sempre com o envolvimento e a participação intensa do Movimento Associativo popular.

No desporto, como na cultura, as opções orçamentais são também esclarecedoras e reveladoras da impossibilidade, por parte do PS, de inverter as políticas dos governos do PSD.

Na área social, acentuou-se e refinou-se a orientação que o PSD já vinha prosseguindo, de desresponsabilização do Estado, entregando a acção social a instituições associativas e outras instituições designadamente da área da Igreja, correspondendo também a uma ambição e reivindicação dessas estruturas que pretendem assumir papel preponderante e mesmo hegemónico na acção social no nosso país.

Noutras áreas de actividade, pelo menos nos últimos seis meses, a situação não é diferente. Isto é, continua a profunda incompreensão face ao papel do Movimento Associativo popular na sociedade portuguesa, incompreensão que não é resolvida com o facto de haver neste ou naquele caso abertura ao contacto e ao diálogo com entidades associativas.

O PS não tem política de desenvolvimento associativo. Não tem demonstrado estar em condições de contribuir para o desenvolvimento associativo do país.

Ao Movimento Associativo fica a responsabilidade de reclamar e reivindicar políticas que tenham em conta os seus direitos, a solução dos problemas das populações e a justa valorização desta importante realidade social, expressão organizada do povo que são as associações.

6
O Movimento Associativo Popular e a União Europeia

Uma União Europeia, subordinada aos critérios de Maastricht em que a coesão económica e social é secundarizada e em que, ao contrário das enunciadas expectativas iniciais, se acentuam as distâncias entre os países mais ricos e os países mais pobres, é uma União Europeia que também tende a secundarizar o papel social do movimento associativo nas sociedades contemporâneas.

Não é por acaso que não existem programas e acções orientadas para o desenvolvimento do movimento associativo a nível comunitário. Quando muito o associativismo pode ter acesso a um leque reduzido de programas comunitários sendo chamado, de um modo instrumental, a dar uma ajuda na solução de problemas concretos (formação, deficientes, idosos, emprego, etc.).

Torna-se indispensável aprofundar a análise dos problemas criados pelo processo de integração europeia e as perspectivas e possibilidades de trabalho que se abrem para o movimento associativo.

Ao associativismo colocam-se os desafios da defesa, preservação e afirmação da identidade cultural do país na cena comunitária; do contributo, de forma própria, para a definição das políticas de cultura, de desporto, de apoio social aos cidadãos, de desenvolvimento local e de configuração dos mecanismos institucionais de participação; da dinamização e promoção da participação popular na vida nacional, na sua relação com os impactos decorrentes da União Europeia; do contacto e do relacionamento com expressões associativas da comunidade para a troca de experiências, a cooperação e a concertação de acções; do combate ideológico aos defensores do pensamento único e da impossibilidade de transformar a realidade actual; do combate a todos quantos apostam na destruição dos corpos intermédios de participação popular e de exercício da democracia.

É necessário que no quadro da União Europeia, se encontre uma linha de dinamização e fortalecimento da rede associativa de cada país e do conjunto da comunidade numa perspectiva de desenvolvimento local e de afirmação de identidade cultural que tem na diversidade a sua maior riqueza.

7
Propostas do PCP
para o desenvolvimento e fortalecimento 
do Movimento Associativo Popular

O PCP considera que é possível e necessário criar condições de trabalho ao Movimento Associativo, com mais meios e mais apoios, assegurando o seu desenvolvimento, o aumento da participação dos associados, a sua mais ampla democraticidade, o seu carácter unitário e independência, no quadro das transformações que a vida vai exigindo.

O PCP considera que é possível, necessário e indispensável tomar medidas que visem fortalecer o movimento associativo, potenciar os meios existentes, dinamizar novas associações para novos interesses, apoiar a acção dos dirigentes no sentido de assegurar o carácter benévolo da sua actividade, e o carácter formativo e profundamente democrático popular do associativismo. Sem procurar responder aos problemas e reivindicações específicas de cada área associativa, matéria de outro tipo de iniciativas, o Encontro Nacional de Quadros do PCP sobre o Movimento Associativo propõe, para o fortalecimento do Movimento Associativo, globalmente considerado :

A adopção pela AR de uma lei quadro que clarifique os mecanismos de apoio da administração central ao movimento associativo;

Adopção de legislação que defina o estatuto do dirigente associativo e que assegure aos dirigentes o exercício das suas funções em melhores condições;

Criação de uma instituição junto da administração central, com delegações regionais, que, entre outras, tenha por funções o apoio e o incentivo ao associativismo e ao seu desenvolvimento, coordenação do quadro de apoios a conceder (apoio técnico, cedência de materiais e equipamentos, apoio a transportes em grupo, apoio à aquisição, construção e reparação ou manutenção de instalações, apoio directo a planos de actividades anuais e outras de acção cultural, desportiva e social ), bem como outras comparticipações, incluindo para formação de dirigentes, activistas e animadores associativos;

A promoção de um plano de formação de dirigentes e animadores associativos, que vise actualizar os conhecimentos e elevar as qualidades de gestão dos dirigentes e crie uma rede nacional de animadores associativos;

Criação de condições mais favoráveis para as associações ao nível da fiscalidade, com a devolução integral do IVA na aquisição de materiais e equipamentos desportivos, musicais, culturais e outros, comprovadamente indispensáveis às actividades não lucrativas das associações , assim como na construção e reparação das sedes;

Encarar medidas que assegurem benefícios ao movimento associativo, na prossecução dos seus fins no que respeita a contribuição autárquica, Sisa, regime de sucessões, policiamento, licenciamento de realização públicas, segurança social dos trabalhadores das associações, tarifas de transporte, custas judiciais, consumos de água e energia eléctrica, preços dos combustíveis para aquecimento, IRC no que respeita às receitas de publicidade no interior de recintos fechados com utilização sem entrada pagas e aos donativos das empresas para associações de utilidade pública ;

Aumento da comparticipação da Administração Central para pelo menos 80% na construção de infraestruturas culturais, desportivas e sociais;

Revogação da legislação sobre porte pago, alargando o âmbito da sua aplicação às publicações e correspondência associativas;

Ajustamento da taxa de direito de autor à realidade associativa;

Criação de incentivos e apoios especiais para associações que desenvolvam actividade visando a integração dos jovens na vida associativa;

Criação de fundo e programa especial de apoio à construção, aquisição, rendas, arranjo e manutenção de instalações de associações;

Apoio à constituição de equipas de técnicos especializados, com formação nas matérias de especialidade das associações a nível local e regional ;

Revisão e actualização da legislação referente ao estatuto de utilidade pública, de acordo com as novas realidades associativas;

Revisão e alargamento do âmbito de aplicação da lei do mecenato a mais vertentes culturais ao desporto e outras áreas;

Admissão do regime especial nas contribuições para a segurança social dos trabalhadores das associações;

Estudo de uma nova política fiscal para as Associações não lucrativas assim como de legislação adequada ao enquadramento do exercício da sua actividade económica de carácter social;

Criação de condições de informação e acesso aos programas comunitários orientados para o apoio às actividades do movimento associativo, assim como a criação de novos programas de apoio à vida associativa;

Lançamento de projectos de desenvolvimento local que integrem a participação dos poderes central e regional e local, as associações culturais e desportivas e os agentes económicos locais e regionais, designadamente através do alargamento das possibilidades de recolha de apoios.»
Fonte: PCP

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