«Descoberto vídeo do mais conhecido e mais odiado espião inglês de todos os tempos
4/4/2016, 9:25
Um vídeo inédito mostra o mais infame espião inglês durante uma conferência na Alemanha de Leste. O espião do KGB explica como serviu de agente duplo para a União Soviética durante anos.
Um vídeo inédito de Kim Philby, a descrever a sua carreira como um agente duplo, foi descoberto pela BBC. A gravação divulgada pela cadeia britânica mostra Philby a presidir a uma palestra da Stasi, o temível serviço de espionagem e, ao mesmo tempo, polícia política da Alemanha do Leste em 1981. A cassete foi encontrada na sede da Stasi, em Berlim.
“Caros camaradas” é como começa a comunicação do agente do MI6, o serviço secreto britânico, que reconta a história da sua vida enquanto espião, desde a sua recruta até à sua fuga do MI6. Durante o comunicado, Philby explica como informava o KGB – serviços secretos da União Soviética – dos segredos que lhe eram revelados enquanto trabalhador do MI6.
Philby inicia a sua comunicação com um tom humoroso, afirmando que não era um orador e que passara “a vida inteira a tentar evitar publicidade, seja de que forma fosse”. Esta informação é praticamente incontestável, já que a única outra gravação do espião que se conhece é uma entrevista dada em casa de sua mãe em que Philby afirmou não ser comunista.
O espião do MI6, nascido em 1912 tomou conhecimento com o comunismo na década de 1930, simpatizando com a ideologia e tornando-se um fervoroso adepto da União Soviética.
Durante a palestra, Philby explicou que o convite para fazer parte dos serviços secretos russos surgiu um pouco “do nada”, já que não tinha qualquer perspetivas para emprego na altura em que foi contactado. Philby afirmou que a aposta feita em si foi uma aposta de longo alcance.
Recrutado pelos russos
Quando foi recrutado pelos serviços secretos russos, Philby foi informado de que a sua missão era entrar nos Serviços Secretos Britânicos para servir como agente duplo. Para conseguir entrar no MI6, Philby começou por trabalhar como jornalista, cobrindo a Guerra Civil Espanhola como parte da equipa do jornal The Times. Depois do fim da guerra civil, o correspondente concorreu a uma cargo no MI6, conseguindo uma posição dentro dos serviços secretos britânicos.
Num dos momentos mais impressionantes de toda a palestra, o ex-espião inglês explica como lhe foi fácil conseguir roubar os documentos secretos do MI6 e passar as informações à União Soviética, uma vez dentro dos serviços de espionagem de Sua Magestade.
Philby explica que lhe bastou tornar-se amigo do arquivista e assim conseguiu acesso a documentos que nem faziam parte da sua secção de trabalho. “Não havia disciplina nenhuma dentro da organização”, confessa Philby.
Todas as noites eu saía do escritório com uma mala cheia de documentos secretos. Entregava-os ao meu contacto que mos devolvia na manhã seguinte, já depois de terem sido fotografados. Isto aconteceu todos os dias, durante anos e anos.” Entre esses documentos encontravam-se trabalhos redigidos pelo agente duplo e outros redigidos pelos seus colegas do MI6.
O agente duplo foi subindo na hierarquia da agência secreta britânica até ser um das pessoas responsáveis por lidar com a espionagem soviética. Mas a União Soviética não estava ainda satisfeita e pediu ao espião para se livrar do seu patrão, Felix Cowgill, e tomar o seu lugar.
Para isto, o espião teve de arranjar uma maneira de “afastar, por vias burocráticas” o seu chefe hierárquico, acrescentando, num momento que arranca gargalhadas de uma audiência de espiões a frase: “Talvez vocês não devessem ouvir isto…” Relativamente ao trabalho de despedir o seu patrão através de políticas, Philby confessa que este foi um trabalho “muito sujo, mas nesta profissão precisamos de sujar as mãos várias vezes, mas fazemo-lo por uma causa que não é minimamente suja“. O espião confessou também que o trabalho de despedir o seu chefe, um homem de quem gostava e admirava, não foi fácil e que teve de inventar as mentiras mais deflagrantes que alguma vez utilizou na vida, “mas as instruções estavam dadas e não havia nada que eu pudesse fazer que as conseguisse alterar.”
“Impedi a Terceira Guerra Mundial”
Durante a conferência, Philby informa que foi responsável por impedir uma Terceira Guerra Mundial, ao prevenir um confronto que iria opor os EUA e a Inglaterra à Albânia comunista.
O episódio em questão foi a decisão de Philby de passar aos russos a informação de que a CIA e o FBI iriam enviar soldados albaneses de volta ao seu país para derrubarem o governo comunista. Quando essa operação se concretizou, muitos dos soldados nacionalistas foram de imediato capturados e mortos pelos serviços secretos albaneses.
Segundo Kim Philby, caso esta operação aliada na Albânia tivesse tido sucesso, os serviços americanos iriam repetir o processo na Bulgária e noutros países, o que poderia originar um conflito a nível internacional.
Questionado sobre como conseguiu manter esta situação durante tantos anos, Philby respondeu que o fez porque o governo inglês era incapaz de reconhecer que pudesse existir um traidor entre as suas fileiras e que todo o MI6 iria perder se fosse revelado que um dos seus agentes principais era um espião da União Soviética.
Agente em Beirute
Na década de 50 dois espiões do MI6 fugiram para Moscovo, levantando questões sobre a lealdade de Philby, que foi interrogado e afastado dos serviços secretos britânicos. No entanto, o espião foi readmitido, posto a funcionar como um agente no Beirute.
Durante a “masterclass” em espionagem, Philby explicou como fugiu do MI6 para se juntar a tempo inteiro ao KGB, depois de ter sido posto sob vigilância por um dos seus colegas britânicos. Aproveitando um nevão para ir esquiar, Philby fugindo pelas montanhas do Líbano, despistando o agente inglês.
Durante as perguntas da audiência, o espião referiu a importância dos seus treinadores físicos e mentais da União Soviética, apelando a que as agências de serviços secretos presentes tomassem bem conta dos seus agentes secretos.
A palestra terminou com um simples conselho de Philby: “O meu único conselho para vocês é que digam aos vossos agentes que eles nunca podem confessar“. E nunca é nunca mesmo, até quando lhe são apresentadas provas concretas de traição.»
Fonte: Observador
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