Eis como nasceram as fábulas sobre os «milhões de vítimas do estalinismo».
do livro "Um Outro Olhar Sobre Stalin", de Ludo Martens
Origem https://bit.ly/3cvoFGW
Em 18 de Fevereiro de 1935, nos Estados Unidos, a imprensa de Hearst – o grande magnata da imprensa e simpatizante dos nazis – inicia a publicação de uma série de artigos de Thomas Walker, apresentado como grande viajante e jornalista, que viajou através da União Soviética durante vários anos. À cabeça da 1ª página do "Chicago American", de 25 de Fevereiro, surgiu um título enorme: «A fome na URSS faz 6 milhões de mortos. Colheita dos camponeses confiscada, homens e animais rebentam». A meio da página, um outro título: «Jornalista arrisca a vida para obter fotos da carnificina». No rodapé: «Fome – crime contra a Humanidade».
Na altura, Louis Fischer trabalhava em Moscovo para o jornal "The Nation". A «cacha» do seu colega, um ilustre desconhecido, intriga-o profundamente. Por isso investiga o caso e apresenta as conclusões aos leitores do seu jornal. «O senhor Walker informa-nos que entrou na Rússia na última Primavera, ou seja, a Primavera de 1934. Ele viu a fome. Fotografou as suas vítimas. Recolheu testemunhos em 1ª mão sobre a devastação da fome que vos despedaçaram o coração. A fome na Rússia tornou-se um tema muito quente. Porque razão teria o senhor Hearst guardado estes artigos sensacionais durante 10 meses antes de os publicar? Decidi consultar as autoridades soviéticas sobre o assunto. Thomas Walker esteve uma única vez na União Soviética. Recebeu um visto de trânsito no consulado soviético, em Londres, no dia 29 de Setembro de 1934. Entrou na URSS a partir da Polónia, de comboio, em Negoreloe, no dia 12 de Outubro de 1934. Não na Primavera, como afirmou. No dia 13 chegou a Moscovo. Permaneceu em Moscovo de sábado, dia 13, a 5ª feira, 18, e tomou em seguida o Transiberiano que o levou à fronteira entre a União Soviética e a Manchúria em 25 de Outubro de 1934 (...) Teria sido impossível a mr. Walker, nos 5 dias compreendidos entre 13 e 18, percorrer 1/3 dos pontos que “descreve” por experiência própria. A minha hipótese é que permaneceu tempo suficiente em Moscovo para obter no azedume de terceiros a “cor local” ucraniana de que necessitava para dar aos seus artigos a falsa verosimilhança que têm».
Um amigo de Fisher, também estadunidense, Lindsay Parrot, havia estado na Ucrânia no começo de 1934. Não viu qualquer sequela da fome de que fala a imprensa de Hearst. Pelo contrário, a colheita de 1933 tinha sido abundante. Fisher conclui: «A organização de Hearst e os nazis desenvolvem uma cooperação cada vez mais estreita. Não vi que a imprensa de Hearst tivesse publicado os relatos do sr. Parrot sobre uma Ucrânia soviética próspera. O sr. Parrot é o correspondente do sr. Hearst em Moscovo...».
Na legenda da fotografia de uma pequena rapariga e uma criança esquelética, Walker escreveu: «Terrível! A norte de Kharkov, uma rapariga muito magra e o seu irmão de 2 anos e meio. Esta criança rastejava pelo chão como um sapo e o seu pobre pequeno corpo estava tão deformado por falta de comida que não parecia humano».
Douglas Tottle, sindicalista e jornalista canadiano, que consagrou um livro notavelmente bem documentado sobre o mito do «genocídio ucraniano», descobriu a fotografia da criança-sapo, supostamente datada da Primavera de 1934, numa publicação de 1922 sobre a fome na Rússia. Uma outra foto de Walker foi identificada como sendo a de 1 soldado da cavalaria austríaca, ao lado de um cavalo morto, tirada durante a I Guerra Mundial.
Triste senhor Walker: a sua reportagem é falsa, as suas fotos são falsas, até ele próprio é falso. O verdadeiro nome deste homem é Robert Green. Evadiu-se da prisão do Estado de Colorado após ter cumprido 2 anos de uma pena de 8. Depois foi inventar a sua reportagem para a URSS. No regresso aos EUA foi preso e reconheceu diante do Tribunal jamais ter posto os pés na Ucrânia.
O multi-milionário Wiliam Randolph Hearst encontrou-se com Hitler no final do Verão de 1934 para concluir um acordo estipulando que a Alemanha passaria a comprar as suas notícias internacionais ao "International New Service", uma agência que pertencia ao grupo Hearst. Nessa época, a imprensa nazi já tinha iniciado uma campanha sobre «a fome na Ucrânia». Hearst dará a sua contribuição graças à imaginação do seu grande explorador, o sr. Walker.
Na imprensa de Hearst apareceram outros testemunhos do mesmo género sobre a fome. Um certo Fred Beal pô-los em letra de forma. Operário estadunidense condenado a 20 anos de prisão na sequência de uma greve, Beal refugiou-se na União Soviética no ano de 1930, trabalhando durante 2 anos na fábrica de tractores de Kharkov. Em 1933, publica um pequeno livro intitulado Foreign Workers in a Soviete Tractor Plant, onde relata com simpatia os esforços do povo soviético. No final de 1933, regressa aos Estados Unidos. Encontra o desemprego, mas também a prisão. Em 1934, começa a escrever sobre a fome na Ucrânia, após o que as autoridades reduzem de forma significativa a sua pena. Quando o seu «testemunho» é publicado por Hearst, em Junho de 1935, J. Wolynec, um outro estadunidense que tinha trabalhado 5 anos na mesma fábrica em Kharkov, apontará as mentiras que entremeavam o texto. Sobre as inúmeras conversas que Beal alegava ter registado, Wolynec nota que Beal não falava nem russo nem ucraniano. Em 1948, Beal ofereceu outra vez os seus serviços à extrema-direita como testemunha de acusação contra comunistas perante o Comité McCarthy.
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