«A EMERGÊNCIA DA ÁSIA
1 – O fim do chamado período da “Guerra Fria” levou a que os detentores de capital adoptassem políticas neo liberais, na tentativa de aplicá-lo em “mercados” que, “abertos”, o pudessem reproduzir e ampliar exponencialmente os seus lucros.
A Ásia passou a ser assim a região dilecta para a aplicação desse capital, uma grande parte dele à disposição da aristocracia financeira mundial anglo-saxónica e por isso, por arrasto, passou a haver a transferência de expedientes científico-tecnológicos e até a deslocação em peso de parques industriais.
Os atractivos eram (e são) imensos e entre eles os atractivos humanos: uma enorme concentração populacional ávida de absorver as tecnologias disponíveis e colocadas à disposição desde o início da Revolução Industrial e uma mão-de-obra disciplinada, barata e comprometida com o trabalho.
A esses quesitos a China juntava outros e entre eles a organização do Partido Comunista, capaz de conduzir um processo tão acelerado de transformações, numa trajectória de abertura que incorreria em previsíveis riscos e imponderáveis de vária ordem, em particular em relação às questões sócio-políticas.
2 – A absorção das ciências e tecnologias modernas, numa conjuntura tão reprodutiva, impeliram a Ásia e muito particularmente a China, para um crescimento colossal num curto espaço de tempo, sem que os desequilíbrios que foram surgindo, inexoráveis desequilíbrios, perturbassem o ambiente sócio-político ao ponto de haver rupturas…
Tarda o desenvolvimento sustentável, por que os processos antropológicos conformes à redistribuição da riqueza e à absorção dos novos padrões de vida podem levar várias gerações, são muito mais lentos, mas a China possui imensas reservas humanas, que lhe dão a possibilidade de, a nível interno, resolver o enfrentamento a pressões internacionais e à recessão que consomem outros.
Resolver as importações de matérias-primas tornou-se uma das questões mais importantes, principalmente de produtos energéticos como o petróleo e o gás, mas essa vulnerabilidade está a ser superada com processos sócio-políticos inovadores: a nível externo, a China está a conseguir esse “milagre” evitando o uso da força, recebendo matérias-primas e fornecendo em troca a possibilidade dos países subdesenvolvidos implantarem infra estruturas e estruturas que nunca tiveram!
Essas possibilidades favorecem aqueles a que se propõem ao resgate de séculos, para aqueles que tiveram de enfrentar as trevas da escravatura, do colonialismo e por acréscimo, no caso da África Austral, do “apartheid”.
As vantagens nesses relacionamentos são imensas e uma delas resulta do facto dos seus competidores ocidentais persistirem em políticas arrogantes e egoístas de manipulação e de ingerência que fazem sistematicamente uso da força militar, directamente ou recorrendo a terceira bandeira… desse modo a China chegou por exemplo, ao coração de África e da América Latina!
3 – Ao integrar o grupo dos emergentes (BRICS), a China assume a liderança em função do seu enorme potencial e por que os outros dispõem de matérias-primas, de “know how” e de tecnologias que possibilitam recursos e intercâmbios alternativos.
O relacionamento forte entre a Rússia e a China era uma questão de oportunidade e a oportunidade chegou: o ocidente está a fazer em relação à Rússia e aos seus interesses geo estratégicos próprios dum país com a sua extensão, aquilo a que sempre se habituou: o uso da manipulação, da ingerência e da força… assim impeliu a Rússia a buscar na China, no extremo oriente, o relacionamento que está a falhar a ocidente.
A China só vê vantagens nesse relacionamento: o petróleo e o gás chegarão mais baratos e em maior quantidade e as tecnologias poderão ser intercambiadas com vantagens recíprocas, a começar na indústria militar, inibindo as possibilidades de competição de outros, ou seja um recuo imenso para as potencialidades do império e do exercício da sua hegemonia!
A força desse relacionamento bilateral será tal que a China, no espaço, tomará o lugar dispensável dos Estados Unidos e daqueles que na Europa se confinarem à hegemonia unipolar!
4 – Se era já tão difícil cercar a Rússia na tentativa persistente de a fragmentar, agora com os novos relacionamentos que estão a ser estabelecidos entre a Rússia, a China e outros vizinhos comuns, uns mais distantes que outros, mas sempre correspondendo a uma imparável emergência, será muito mais difícil cercar ambos, até por que a Rússia, no imenso espaço euroasiático reforça as suas alianças com a Bielorrússia, o Cazaquistão, a Arménia e o Quirguistão, a oeste e a sul.
A China alarga assim as suas potencialidades e projectos como a ferrovia da “rota da seda”, ou a rota marítima do Árctico entre o Pacífico Norte e o Atlântico Norte, ou o canal da Nicarágua…
Se a China absorveu capitais, conhecimentos científicos e processos tecnológicos, o modelo de seus relacionamentos externos conduz a ampliar esses relacionamentos em benefício dos equilíbrios que urge construir no planeta, libertando a humanidade do colete de forças do império anglo-saxónico que de forma tão persistente persegue a hegemonia unipolar!
A emergência dos BRICS é assim a anunciada decadência do império que teimosamente se agarra aos padrões dessa hegemonia unipolar com todo o seu arsenal de meios, de manipulações e de capacidades de ingerência, arrogantes e opressores, mesmo que tente confundir através de “processos soft” de presença, como o AFRICOM em África!
Em relação a isso a Europa está a fazer a sua escolha: ou é arrastada para um processo egocêntrico, obsoleto, decrépito e ultra criminoso, que em desespero de causa vai aglutinando fascismo, expedientes neo nazis e fundamentalistas islâmicos, ou assume a oportunidade de mudança, na tentativa de alcançar os equilíbrios emergentes que se vão dinamizando por todo o mundo!
Martinho Júnior.
Luanda.
2 de Junho de 2014.
Mapa de exportações da Ásia onde se nota um dos “produtos acabados” da influência da hegemonia unipolar do império: o ópio, principal exportação do Afeganistão, cujos centros importadores e consumidores principais estão disseminados entre a América do Norte e a Europa!»
Fonte: Página Global
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