quinta-feira, 13 de agosto de 2015

ARTE XÁVEGA

«Furadouro: BARCOS TÍPICOS da Arte Xávega com TRISTE FIM
Rubrica Atual | Agosto 1, 2015

Sendo a antiga relação com o mar a razão da formação do povoado que deu origem ao Furadouro, no Concelho de Ovar, em que através de séculos se baseou na atividade piscatória com uma significativa evolução dos métodos e técnicas de obter do mar o sustento das centenas de famílias que dependiam da faina da pesca que chegou a dar origem a uma significativa indústria como as conservas.

Na memória coletiva sobre esta relação com o mar, ficaram tragédias, anos de fome ou anos de fartura, como da sardinha num ano (1876) que Ramalho Ortigão citou o Furadouro na sua obra “As praias de Portugal”, entre as praias obscuras.

A profunda relação com o mar, mas também as mudanças económicas e sociais do país que se refletiriam inevitavelmente na comunidade piscatória do Furadouro ficaram igualmente na memória coletiva através do filme “Mudar de Vida” realizado pelo cineasta Paulo Rocha, que faleceu em 29 de dezembro de 2012 no Porto, sua terra natal.

Um filme rodado em 1966 em que o seu autor tratou a vida dura dos pescadores e a necessidade de procurarem trabalho nas fábricas. Uma mudança de vida num quadro marcado pela fúria do mar que destruía as precárias casas assentes na areia, ou em que se começava a assistir ao desmantelamento das grandes Companhas de pesca costeira, sem esquecer a guerra de África e a emigração. Destacando-se no elenco deste filme que mobilizou a população local, os atores Geraldo Del Rey, Isabel Ruth, João Guedes e, no papel de “Júlia” a atriz Maria Barroso que faleceu no dia 7 de julho deste ano.

De todo o historial e património cultural e humano da atividade de pesca no litoral vareiro através da típica arte xávega e suas caraterísticas embarcações, são cada vez mais raros os exemplares que resistem ao tempo e, sobretudo ao abandono a que esta arte foi votada nas últimas décadas.

Sem concorrência, na praia do Furadouro só o barco “Jovem” vai ao mar para ajudar um também cada vez mais reduzido número de pescadores que ainda vão dando vida no areal às sempre atrativas manobras que envolvem puxar as redes e recolher o pouco peixe que o mar vai dando. Em terra foram ficando embarcações a apodrecer como sinal do estado a que esta atividade chegou a exemplo da emblemática geração de barcos Srª da Graça.

O nome Srª da Graça foi ao longo de décadas uma referência entre as embarcações da Arte Xávega na praia do Furadouro cujo proprietário, o conhecido banheiro, concessionário e arrais António Soares Maganinho que enquanto teve forças para trabalhar lado a lado com os pescadores da sua Companha, foi investindo na manutenção de sucessivas gerações com o nome Srª da Graça num total de três batizados com o mesmo nome, cujos últimos exemplares destas embarcações terminam de forma pouco dignificante. Enquanto o primeiro barco Srª da Graça que teve o mérito de representar a pesca tradicional da arte xávega e Ovar Exposição dos Oceanos, na EXPO’98, e que posteriormente foi doado ao Município de Ovar para fins Museológicos em 5/02/1998 acabando por ser colocado numa rotunda no norte do Furadouro está visivelmente em mau estado, dada a falta de revestimento adequado para a preservação desta peça de arte em madeira.

O último (terceiro) barco da geração Srª da Graça encontra-se igualmente em desagregação, enterrado nas dunas, podendo aí acabar a história de um nome de embarcações que marcaram como postal turístico da praia do Furadouro. Só mesmo o segundo barco desta geração escapou a tão deprimente abandono e degradação, tendo alcançado um lugar no Museu de Ílhavo doado também por António Maganinho que os veraneantes ainda hoje vão vendo ali sentado junto à área de concessão da sua família no Furadouro, olhando serenamente para o mar a que dedicou uma vida toda e certamente sofrendo a amargura que o estado de destruição dos seus barcos lhe causarão, mesmo que em silêncio.

 Texto e fotos: José Lopes (*)

(*) Correspondente “Etc e Tal Jornal” em Ovar»

01ago15

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